Devolver para transformar

02/03/2006

Desenvolvido, desde 1994, pelo MOC em parceria com a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e Secretarias Municipais de Educação, o Projeto Conhecer, Analisar e Transformar (CAT) tem mudado a realidade da Educação do Campo nos municípios da Região Sisaleira onde atua. Com uma metodologia simples, na qual o objetivo é modificar a realidade do campo e contribuir para o desenvolvimento sustentável da comunidade e do município, o CAT sempre propôs mudanças a partir do que fosse identificado, na pesquisa, realizada por alunos e professores, como deficiente, ausente ou ruim.

Essa experiência pedagógica acontece da seguinte forma: no final da unidade letiva ou da vivência de uma ficha pedagógica, os trabalhos produzidos na escola, a partir da pesquisa (textos, tabelas, desenhos, dramatizações, paródias), que contém as necessidades do local, são apresentados aos pais e a comunidade. Nos municípios onde o CAT tem atuado há mais tempo já se percebe grandes resultados, como a redução das queimadas na caatinga, sem falar nas pessoas que estão mais unidas e organizadas em busca de melhorias para a comunidade.

Devolvendo conhecimento

Em 2004, intensificou-se o esforço por debater com a comunidade o que é possível fazer para melhorar a vida das pessoas. As reuniões continuaram, porém com uma nova finalidade, não só de apresentar o que foi construído, mas também de discutir o que fazer com e a partir destes conhecimentos. Surgiu com isso a chamada devolução.

De acordo com Naidison Baptista, Secretário Executivo do MOC, as devoluções são os momentos mais importantes dos processos educativos que se dão a partir do CAT. Isso porque a metodologia do CAT prevê que a escola não seja apenas um veículo repassador de conhecimentos e conteúdos gerados por outros. Ela quer transformar a escola seja numa produtora de conhecimentos sobre a realidade local, a partir dos quais a comunidade possa mudar sua vida para melhor. "Em outras palavras: a escola produz conhecimento e de posse desse conhecimento a comunidade modifica sua vida. A devolução, então, é justamente este momento em que a escola entrega à comunidade o conhecimento produzido", explica Naidison.

Segundo ele, através das devoluções, a escola mostra à comunidade que muitas famílias não criam animais que poderiam criar para melhorar sua renda e alimentação. Em outros casos a escola mostra à comunidade que boa parte das escolas do município não possuem cisternas para água potável e nem filtram a água que as crianças bebem. Ou, em mais um exepmlo, a escola mostra a comunidade que quando a merenda escolar é comprada nas famílias o desenvolvimento das comunidades é maior, e assim sucessivamente.

"As devoluções constituem o momento em que as crianças apresentam aos pais e à comunidade os conhecimentos que conseguiram construir, a partir da pesquisa feita sobre a realidade. É a transição entre o analisar e o transformar" afirma Josevonne Serafin, técnica do Programa de Educação do Campo do MOC, acrescentando que esse é mais um momento de reflexão para discussão coletiva, do que de festa, apesar da alegria que reina nas crianças e nos pais, ao ver o que foi descoberto, criado, manifestado e realizado.

Segundo ela, com estes conhecimentos sistematizados em tabelas, gráficos, maquetes, textos e dramatizações, discute-se o que precisa melhorar naquela localidade ou no município e como as mudanças podem ser realizadas. As devoluções são momentos riquíssimos que envolvem todos os cidadãos da localidade, independente de função, profissão, geração, etnia ou religião. Cada um tem um papel diferente a desempenhar. É a concretização do provérbio "A união faz a força".

Para Naidison, o importante é que o conhecimento produzido não fique guardado. Conhecimento é para ser usado para o bem das pessoas. "Quando a escola produz conhecimento e devolve, mostra, entrega este conhecimento à comunidade, a escola é um grande instrumento de desenvolvimento. Por isso é que a escola do CAT é diferente. Ela quer ajudar as pessoas a conhecer, a analisar e a transformar a realidade.

As "devoluções" se espalham pelo sertão

Apesar da metodologia de devoluções ter sido implantada no CAT em 2004, foi em 2005 que os avanços aconteceram. Nove municípios realizaram Seminários de devolução nas escolas ou por núcleo. Cinco organizaram e promoveram Seminários Municipais com a colaboração e participação do poder público e movimentos sociais do município. Cada um no seu estilo, jeito e possibilidade, criando momentos de discussão e transformação da realidade.