Disparidades caracterizam a situação da infância na Região Sisaleira

13/01/2006

O relatório Situação da Infância Brasileira 2006, lançado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em Dezembro do ano passado, traz pela primeira vez dados que mostram os avanços e retrocessos dos municípios brasileiros com respeito às condições de vida das crianças nos últimos cinco anos. Para medir a situação da infância, o Unicef desenvolveu o Índice de Desenvolvimento Infantil (IDI) como instrumento que contribui para a formulação e o monitoramento de políticas públicas voltadas para a infância no Brasil.

O primeiro levantamento completo do IDI no Brasil foi realizado em 1999, desenhando um quadro completo do desenvolvimento infantil com o objetivo de promover e desenvolver políticas públicas orientadas para os primeiros seis anos da criança, período em que se formam grande parte das capacidades cognitiva, emocional, social e de desenvolvimento físico da pessoa. No relatório Situação da Infância Brasileira 2006 consta agora a comparação do IDI referente ao ano de 1999 com o de 2004. Em termos gerais, no período entre o cálculo dos dois índices houve melhoria significativa. O valor nacional saltou de 0,61 para 0,67, apresentando acréscimo de quase 10%. Entretanto, para efeito de interpretação, com base na mesma classificação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), esse valor ainda é considerado um padrão médio de desenvolvimento infantil.

Mudança na qualidade de vida

O município de Retirolândia na Região Sisaleira da Bahia foi pioneiro na implementação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) em 1997. Dois anos depois, o IDI municipal de 0,396 estava entre os piores da Bahia e do Brasil, ocupando a 150° posição no ranking estadual. Em cinco anos, a situação melhorou significativamente, apresentando um IDI 70% maior (0,672) e passando a ocupar a 18º posição, colocação inclusive a frente da capital do Estado, Salvador, com IDI de 0,667. "Nós avaliamos esse resultado como um esforço conjunto das ações desenvolvidas no município para buscar o seu crescimento, desenvolvimento e progresso", comenta a Secretária de Assistência Social do município, Maria Raimunda.

O Índice de Desenvolvimento Infantil incorpora variáveis relacionadas à oferta de serviços de saúde e de educação, além do cuidado e proteção que a família deve proporcionar à criança nos primeiros anos. A família e a comunidade têm responsabilidades importantes nos cuidados com a criança. "A preocupação com o envolvimento da família é um fator predominante nas ações desenvolvidas no município. Muitas vezes, esses compromissos não são assumidos como gostaríamos pela família, mas estamos procurando fazer a nossa parte. Entendemos que as famílias devem ser parceiras fundamentais nas atividades desenvolvidas como reuniões, festas, comemorações diversas, e manifestações culturais", reforça a secretária.

Em Retirolândia, diversas ações e projetos estão sendo desenvolvidos para garantir a melhoria na qualidade de vida das crianças. Segunda a Secretária, o apoio no processo de desenvolvimento e fortalecimento da auto-estima da criança é um destaque nas atividades, além do enriquecimento das atividades lúdicas, artísticas esportivas e culturais: "Destacamos o desenvolvimento da comunicação através de ações como o jornal Giramundo e a produção do programa de rádio nas jornadas ampliadas", comenta Maria Raimunda.

Retrocesso em Monte Santo

Mesmo com resultados interessantes de melhoria na qualidade de vida das crianças no município de Retirolândia, outros municípios da Região do Sisal continuam com dados alarmantes em relação ao Índice de Desenvolvimento Infantil. É o caso do município de Monte Santo, a 400 km da capital baiana, onde a situação das crianças e adolescentes é precária. Segundo os dados do relatório do UNICEF, o município ocupa a pior posição do Estado da Bahia, com IDI de 0,204 em 2004 e está entre os dez piores do Brasil. Em 1999, o IDI era ligeiramente melhor, com 0,218. Portanto, é um dos poucos municípios que, já a partir de um patamar muito baixo, ainda retrocederam no desenvolvimento infantil. "O trabalho infantil sempre foi um fator muito forte no município, depois do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) a situação melhorou, mas o trabalho ainda não foi erradicado como gostaríamos", afirma Umberto Oliveira, tesoureiro do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Monte Santo.

Alguns dados de educação do município podem esclarecer a posição do município entre os piores do Brasil no tratamento à criança. Na cidade existem, por exemplo, apenas duas instituições que oferecem pré-escola e uma creche para atender as 7.357 crianças de até cinco anos, de acordo com a Secretaria da Educação do Estado da Bahia. Das crianças com até seis anos do município, apenas 2,65% estão matriculadas na pré-escola. Questionada a respeito dos dados negativos do município, a Secretária de Assistência Social do Município, Ivone Oliveira, questionou a veracidade dos dados e afirmou que o município tem buscado a cada dia garantir a melhoria na condição de vida das crianças e adolescentes do município.

Outra questão levantada pelo tesoureiro do STR, Umberto Oliveira, está ligada a capacitação dos professores do campo. Umberto afirma que os professores não são capacitados o suficiente para o trabalho junto às crianças: "Os professores rurais do município precisam ser mais capacitados, pois muitas vezes, por não conhecerem a realidade, não valorizam os elementos culturais do campo, como a agricultura, o jeito de viver da população" completa.

Envolvimento de todos

Naidison Baptista, Secretário Executiva do MOC, que desenvolve projetos voltados para crianças e adolescentes nos dois municípios, afirma ser preciso o envolvimento de todos para discutir políticas públicas voltadas para as crianças. A região de atuação do MOC tem se destacado nessa área, em especial no envolvimento e articulação das entidades, comunidades e famílias em projetos como o PETI e o Baú de Leitura, que recentemente foi premiado pela Caixa Econômica Federal uma das 10 melhores práticas em gestão local. "Nós estamos desenvolvendo coisas boas que criamos e está trazendo dias melhores para nossas crianças. Isso significa reconhecimento para as prefeituras municipais que estão envolvidas no trabalho, para os educadores, para a equipe do MOC e principalmente, para a equipe que faz o PETI - a SETRAS (Secretaria do Trabalho, Assistência Social e Esporte), a Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil, o UNICEF e em especial, os educadores e as crianças que são aqueles que fazem acontecer às ações no município e na região", completa.