ASA busca novo desafio que plenifique as ações de convivência

11/04/2012

Quando o governo federal assumiu, através do Plano Brasil sem Miséria, o compromisso de universalizar o acesso à água de beber, através as cisternas que guardam água da chuva, a ASA percebeu que o objetivo que fez a rede nascer deve ser alcançado nos próximos dois ou três anos.

A satisfação em estar contribuindo significativamente para a consolidação de uma política pública, que garante água potável em todos os lares rurais do Semiárido, se transforma, por outro lado, num grande desafio para a Articulação. Com a universalização, uma das duas linhas de ação da rede – o Programa Um Milhão de Cisternas – tende a se extinguir.

E aí surge a necessidade de olhar para si, para o atual contexto do Semiárido e reprojetar o futuro da rede. O desafio que impera na ASA é descobrir um novo caminho para “plenificar a convivência com o Semiárido”, como disse Naidison Baptista, coordenador executivo da ASA pelo estado da Bahia.

Desta quarta até sexta-feira que vem (11 a 13), cerca de 70 pessoas dos nove estados do Semiárido vão se reunir em Moreno, na Região Metropolitana do Recife, e estarão empenhadas em discutir e propor, de forma coletiva, as possibilidades para o futuro da ASA. Este grupo representa a Coordenação Executiva Ampliada, a segunda maior instância deliberativa da rede.

Para falar sobre este momento de mudanças e sobre o encontro em Moreno, Verônica Pragana , jornalista da Asacom, entrevistou Naidison Baptista. Confira!

Asacom – Todas as famílias do Semiárido estão conquistando a água de beber e cozinhar, com a universalização do acesso à água, através das cisternas de 16 mil litros. O que significa este feito para a história da ASA?

Naidison – Significa muito porque a ASA, quando instituiu o P1MC [Programa Um Milhão de Cisternas], objetivava que todas as famílias do Semiárido brasileiro tivessem acesso à água potável. Por isso a ASA vem batalhando, buscando apoios privados e, principalmente, incidindo na linha das políticas públicas, através da parceria com o governo federal, na perspectiva de que [a construção das cisternas de 16 mil litros] seja uma política que atenda o direito básico de acesso à água de qualidade para beber e cozinhar para todas as pessoas. Na perspectiva da ASA, o fato do governo decidir e assumir a universalização é uma vitória nossa.  É uma coisa que sempre buscamos e que agora estamos conquistando. Nós e o povo do Semiárido. É algo politicamente muito importante e que a gente deve estar vigilante de dois modos. O primeiro é que devemos contribuir para que isto aconteça, efetivamente construindo cisternas, capacitando pessoas, difundindo o processo de convivência com o Semiárido brasileiro. E o segundo é estar vigilante para o que esteja acontecendo, ocorra realmente dentro dos moldes de respeito à população e de respeito aos seus direitos. É um momento em que todos e todas devemos nos orgulhar, alegrar, nos rejubilar, porque é um momento de uma conquista histórica também.

Asacom – O que esta realidade aponta para o modo de atuar da Articulação?

Naidison - Se este processo se concretiza e se há uma universalização real em dois ou três anos, isso implica para a ASA que uma das duas linhas mestras de ação de seu processo de convivência com o Semiárido está se extinguindo. Isso não é ruim. Isso é bom. Se ela está chegando ao seu final é porque nós estamos chegando ao nosso objetivo. Temos que olhar nesta perspectiva. Indica pra nós um questionamento muito grande: por onde vamos de agora em diante para manter as nossas perspectivas e a nossa característica de uma rede que não só articula pensamentos, que não só articula reflexões, não só articula debate político, mas articula também as pessoas e as articulações, fazendo acontecer os debates e os processos no dia a dia da vida das pessoas? Esse é um momento de reflexões: por onde nós vamos? O que nós vamos fazer de agora por diante? Qual a ação que terá um impacto semelhante, igual ou até maior do que o impacto das cisternas? E como nós, enquanto rede, vamos nos preparar para entrar nesta ação? Ao lado disto há o desafio da continuidade - forte, grande, significativa - da busca da água de produção. Se as pessoas têm água para beber e cozinhar, falta ainda para elas outro passo significativo que é a água para produção. Como nós vamos nos organizar para que o processo da água da produção possa ser aumentado, potencializado e, inclusive, entre na perspectiva da universalização porque isto também é convivência com o Semiárido. Mas ao lado do P1+2, da água de produção, nós temos que buscar outros sinais, outras ações, outras questões, onde se materialize a vida e a ação da ASA.

Asacom – A partir de hoje, a ASA está realizando um encontro da Coordenação Executiva (CE) Ampliada. Qual é o objetivo deste momento e quais são as suas expectativas?

Naidison – A CE ampliada é uma instância deliberativa da ASA. Abaixo do Enconasa [Encontro Nacional da ASA], é a maior  instância deliberativa. É formada por quem? Pelos coordenadores e suplentes de cada estado e por pessoas estritamente escolhidas nesta ocasião pelos estados dentro de critérios estabelecidos pela CE para tomarem decisões coletivamente sobre os destinos da Articulação no Semi-Árido Brasileiro. Então essa CE Ampliada que se reúne nos dias 11, 12 e 13, em Moreno, tem dois objetivos principais. Um deles é refletir a realidade do Semiárido: olhar, constatar, ver o que já se conquistou na perspectiva de convivência com o Semiárido, o que permanece ainda de convivência com a seca, quais são os atores que estão atuando no Semiárido, quais são as suas perspectivas, como a ASA pode e deve se interrelacionar com estes atores. Ao lado disto, fazer um balanço da nossa ação: onde já chegamos, o que construímos, o que já conseguimos, quais são as nossas vitórias, quais as ameaças ao nosso projeto de desenvolvimento no Semiárido.E a partir daí, projetar a ação da ASA para os próximos anos. Essa projeção vai desembocar no Enconasa, que vai acontecer no final deste ano, em Minas Gerais. O Enconasa vai tomar a decisão definitiva, mas a CE Ampliada vai projetar isso. Então, ela vai começar a se perguntar se dentro de dois anos o programa de água para beber, primeira água ou água para consumo humano vai estar finalizando, que outra ações nós podemos colocar que sejam significativas, importantes e que plenifiquem a dimensão de convivência com o Semiárido. Pode ser a dinamização do processo de sementes crioulas, pode ser o fundo rotativo solidário, pode ser “n” possibilidades que as pessoas olhando o chão do Semiárido, a sua realidade, o dia a dia e as potencialidades da ASA podem recomendar que sejam ações importantes para que a ASA assuma de agora em diante ou comece a se preparar para assumir.
Esse é o grande desafio da CE Ampliada nos próximos três dias: olhar a ASA, suas conquistas, limites, potencialidades, desafios, capacidades, possíveis parceiros e projetar uma ação que seja significativa não pura e simplesmente como substituição ao P1MC, mas uma ação que plenifique a dimensão de convivência com o Semiárido. Se já temos a água de beber, de produzir e queremos dinamizar, ampliar o processo de água de produção, que outras ações a ASA na sua totalidade, em todos os estados, poderia assumir para de ir construindo a cada dia outros aspectos da convivência com o Semiárido? Tenho certeza de que vamos produzir coisas boas e que projetem a ASA pra frente no dinamismo que ela tem.

Asacom - Neste momento de pensar o futuro e decidir quais caminhos podem ser tomados, quais os cuidados que é preciso ter?

Naidison – Há vários cuidados. Primeiro, o cuidado de pisar no chão. Nós somos entusiastas da convivência com o Semiárido. Nós queremos a transformação do Semiárido. Isso, por vezes, nos leva a projetar ações que não são possíveis naquele momento. Temos que pensar com muito carinho e muito cuidado para o que é possível, o que se torna passível de ser realizado, o que é que pode entusiasmar a comunidade, para que a gente caminhe por aí. É melhor darmos 10 passos seguros do que sonhar com mil que não se realizem. O que não quer dizer que não devemos sonhar. O sonho de todas as famílias terem água potável foi um sonho, mas começamos a concretizá-lo gradativamente até chegar ao seu patamar de hoje. Um segundo elemento ao definir ações para o futuro da ASA é olhar ações que possam ser trabalhadas por todo Semiárido. Não adianta eu trabalhar uma coisa no estado da Bahia e o Piauí não ter condições de trabalhar a mesma coisa. Nós temos que olhar a rede em sua totalidade. Esse é um segundo aspecto: elementos que englobem toda a rede e não parte dela porque vamos ter unidade na reflexão, na execução, no processo de construção destes elementos. Um terceiro, que eu acho importante e que a CE Ampliada pode achar diferente, é identificar elementos que entusiasmem a comunidade e que por isso tenham valor forte para ela. Uma das chaves do P1MC é o valor da água, a importância da água. Isso mobilizou as pessoas, projetou as pessoas e projetou as comunidades nesta luta. É por esta estrada que nós vamos manter a rede viva. Nós não mantemos a rede viva nas elocubrações, nas conversas, nas reflexões, todas são importantes, mas temos que descobrir estradas que sejam concretas e que as pessoas possam assumir. Um outro elemento que acho importante é ter cuidado de projetar ações que sejam significativas e que tenham alto poder de replicação, que possam ir gradativamente se transformando em políticas públicas. São cuidados a nível metodológico, político, que devemos ter no nosso debate para que saiamos do debate fortalecidos de um lado porque conquistamos a universalização da água de beber e de cozinhar e de outro lado porque projetamos o futuro da ASA na sua perspectiva de ir conquistando a segurança alimentar e a convivência com o Semiárido.

 

Fonte: Site da ASA


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