Comunitária de verdade

14/02/2007

No dia 19 de fevereiro de 2007, a Lei nº 9.612, que instituiu o serviço de radiodifusão comunitária no país, completa nove anos. Apesar das restrições e contradições existentes na legislação que dificultam a concessão e manutenção de rádios comunitárias, o município de Capim Grosso, localizado a 240 km de Salvador, confirma porque a radiodifusão comunitária ganhou a simpatia do povo.

Com uma população estimada em 26.570 habitantes, o município de Capim Grosso tem no comércio e na prestação de serviços a principal atividade econômica. No entanto, entre os serviços prestados à comunidade, a rádio comunitária Contorno FM está se destacando.

Jornalismo Comunitário

Para Ney Oliveira, vice-presidente da Contorno FM, o jornalismo praticado pela rádio é essencialmente comunitário. “Tudo que a emissora coloca no ar é voltado para a comunidade, principalmente para as pessoas mais carentes que não têm acesso a revistas, jornais ou internet. Para a rádio, esse é o público que mais necessita dessa abertura de visão que a rádio comunitária propõe através do seu jornalismo”, disse Ney Oliveira.

De acordo com Ney, a cada hora são divulgados informativos que totalizam seis edições diárias. Ao meio dia, vai ao ar o programa Notícias da Contorno com os principais acontecimentos estaduais, nacionais e internacionais, relacionadas com os fatos locais. Além dessas informações, o Notícias da Contorno possui espaço para a denúncia, que segundo Ney Oliveira é a alma do programa. “O programa bota o povo para falar, fazendo a ponte entre comunidade e autoridade”, revela o vice-presidente da rádio.

Uma rádio de todos e para todos

Um dos exemplos para o esforço constante da equipe de dar oportunidade à difusão de idéias, opiniões e oferecer mecanismos à formação e integração da comunidade, é o programa Contorno nos Bairros. “No decorrer da programação nós recebíamos muitas reclamações, bilhetes e cartinhas. Com isso, nasceu a idéia de criar o Contorno nos Bairros, devido a essa necessidade das pessoas reivindicarem e não terem a oportunidade”, conta Agnaldo Silva, repórter responsável pelo programa.

A cada semana, o carro de transmissão da rádio se desloca para um bairro diferente onde os moradores podem participar da programação com reivindicações e sugestões. Assim, o programa se constitui em um importante instrumento para que as autoridades do município possam conhecer os problemas que afetam cada bairro da cidade. Isso se comprovou na série de reportagens que ouviu a opinião da população sobre a saúde no município. O resultado das entrevistas revelou a insatisfação dos usuários do serviço e a necessidade de investimentos nessa área.

Campanhas para doação de sangue, arrecadação de alimentos, localização de documentos perdidos, procura por pessoas desaparecidas, doação de cadeira de rodas para deficientes físicos são outros exemplos para os serviços oferecidos pela rádio.

Desafios da radiodifusão comunitária

De acordo com o pesquisador Antônio Dias, coordenador de uma pesquisa sobre as rádios comunitárias na Região Sisaleira da Bahia, “o estabelecimento de uma legislação específica representou uma conquista, na medida em que conferiu existência legal às emissoras. No entanto, ainda há muito que se avançar. A burocracia é muito grande e acaba gerando a necessidade de uma assessoria técnica e jurídica para a montagem de uma rádio comunitária, acarretando em muitas despesas”.

Para o presidente da Contorno FM, Valter Oliveira, o principal desafio da rádio comunitária é o limite presente no apoio cultural, no espaço ocupado pela rádio e no que pode ser expresso. Ele conta que a Contorno FM sofreu muitas sanções por deixar o povo falar o que pensa. Admite que as pessoas também excedem nas falas, mas que a rádio foi feita para o povo e esse espaço deve ser garantido.

Outro desafio para as rádios comunitárias é a perseguição política. Como se constitui em uma importante mídia para as comunidades que não possuem meios para falar de si mesmas, alguns políticos enxergam nessas emissoras uma ferramenta de manipular a opinião. No país, diversas rádios se intitulam comunitárias, mas na verdade servem a interesses de políticos ou a grupos religiosos.

Valter Oliveira diz conhecer rádios que nunca sofreram repressão por que não se preocupam com os interesses da comunidade. “Eles apóiam tudo o que acontece. Se para eles está bom, tanto faz o que acontece com o povo, ou seja, a informação nunca chega da forma que deveria chegar”, relata.

Amor pelo trabalho

A rádio Contorno FM está no ar há cinco anos. A equipe que integra a emissora é formada por profissionais experientes como Agnaldo Silva que está atuando no ramo há 15 anos. Antes da Contorno FM, atuava em rádios comerciais de Conceição do Coité e Feira de Santana. Agnaldo revela que o rendimento financeiro é pouco, mas que o trabalho desenvolvido é resultado de um ideal. “Faço esse trabalho por amor, por gostar da minha cidade, por vontade de ver as coisas acontecerem de forma diferenciada”. E seu colega Ney Oliveira completa: “Nós temos feito o nosso trabalho com muito amor, enfrentando problemas, perdendo apoio no campo financeiro, mas não perdemos o nosso alvo principal que é fazer de verdade o trabalho de radiodifusão comunitária que coloca o povo para falar, o povo come senhor desse projeto”.

Para conhecer mais detalhes do trabalho desenvolvido pela rádio Contorno FM, acesse www.contornofm.com.br